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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2004 Susan Lisa Jackson

© 2019 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Mentiras perfeitas, n.º 625 - agosto 2019

Título original: Best-Kept Lies

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-1328-516-0

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Créditos

Prólogo

Capítulo Um

Capítulo Dois

Capítulo Três

Capítulo Quatro

Capítulo Cinco

Capítulo Seis

Capítulo Sete

Capítulo Oito

Capítulo Nove

Capítulo Dez

Capítulo Onze

Capítulo Doze

Capítulo Treze

Se gostou deste livro…

Prólogo

 

 

 

 

 

– Estou a morrer, minha pequena Randi, e não há mais nada a dizer.

Randi McCafferty deteve repentinamente a sua apressada descida pelas escadas de madeira da casa onde fora criada; uma velha quinta situada numa pequena colina do Montana. Ia absorvida nos seus próprios pensamentos e não reparara que o seu pai estava sentado num cadeirão com o olhar fixo no tecto da sala, enegrecido devido à lareira. John Randall McCafferty continuava a ser um homem corpulento apesar do passar do tempo lhe ter reduzido a estatura, em tempos imponente, a extrema compostura.

– O que dizes? – perguntou ela. – Tu vais viver para sempre.

– Ninguém vive para sempre – respondeu ele, levantando a vista para ela. – Quero só que saibas que metade disto será para ti. Os rapazes vão ter que lutar pelo resto. O orgulho do Montana será teu. Brevemente.

– Não quero que fales assim – disse ela, entrando na penumbra da sala. Olhou para a janela empoeirada, do outro lado estava o alpendre e para além deste o vasto terreno que circundava a quinta. O gado e os cavalos pastavam nos campos mais além do estábulos e do picadeiro, sem descanso.

– Terás que o aceitar. Vem cá. Vá, vá, sabes que ladro muito mas não mordo.

– Claro que sei – respondeu ela. Nunca presenciara o lado mau do temperamento do seu pai, mas os seus meios-irmãos já tinham sido confrontados com ele várias vezes.

– Quero só olhar para ti. A minha vista já não é tão boa como antes – disse o homem, rindo por entre dentes e tossindo com tal violência que se ouvia a ressonância dos pulmões.

– Papá, acho que eu devia chamar o Matt. Devias estar no hospital.

– Não – respondeu ele, gesticulando com a mão ossuda ao ver que ela atravessava a sala. – Nenhum médico me poderá curar.

– Mas…

– Não me respondas. Quero que me oiças, pelo menos uma vez na vida – interrompeu-a o idoso, olhando-a com uns olhos incrivelmente claros e pondo-lhe um envelope amarelo na mão. – Aqui está o meu testamento. O Thorne, o Matt e o Slade ficam com a outra metade da quinta, coisa que lhes deveria agradar bastante – o homem emitiu uma gargalhada malvada. – De certeza que vão lutar por ela como se fossem pumas sobre uma presa… mas tu não terás que te preocupar. A ti calhou-te a parte do leão – sorriu com a sua própria brincadeira. – A ti e ao teu bebé.

– O meu quê? – disse ela, sem mexer um músculo.

– O meu neto. Estás grávida, não é? – perguntou, revirando os olhos.

A jovem sentiu que corava. Não dissera nada a ninguém sobre a sua gravidez. Ninguém sabia, excepto o seu pai, ao que parecia.

– Sabes – continuou o homem, – gostava que te tivesses casado antes de engravidares, mas agora já está feito e eu não estarei cá tempo suficiente para ver a criança. No entanto, deixarei tudo tratado para que não falte nada a nenhum dos dois.

– Eu não preciso que tomem conta de mim.

– Eu acho que precisas, Randi – disse o seu pai, o sorriso tinha desaparecido do seu rosto. – Alguém tem que cuidar de ti.

– Eu posso tomar conta de mim própria… e também do meu bebé. Tenho uma casa em Seattle, um bom emprego e…

– E nenhum homem, pelo menos nenhum que valha a pena – respondeu o homem. Vais dizer-me quem foi esse miserável que te deixou grávida?

– Já falamos disto várias vezes…

– Todas as crianças têm o direito de saber quem é o seu pai – respondeu o homem. – Inclusive se o homem é um desgraçado que engravida uma mulher e depois a abandona.

– Se tu o dizes – respondeu ela, apertando o envelope entre os dedos. Notava que havia mais alguma coisa no seu interior para além de papel. Como se tivesse adivinhado a sua surpresa, não demorou para lhe explicar.

– Há também um fio. Um relicário, na verdade. Era da tua mãe.

Randi notou que ele ficou com um nó na garganta.

– Eu lembro-me. Ofereceste-lho no dia do vosso casamento.

– Foi – disse ele, assentindo com um gesto rápido e ficando, de repente, com os olhos mais suaves. – A aliança também está dentro do envelope, se a quiseres.

– Obrigada – disse ela, com os olhos húmidos.

– Ficarei muito contente se me disseres quem te fez isto.

Como resposta, a rapariga levantou o queixo e franziu a testa.

– Não me vais dizer, pois não?

Randi olhou o seu pai nos olhos.

– Antes disso o inferno terá que ficar congelado.

– Raios, miúda, és mesmo teimosa.

– Acho que sei de quem herdei isso.

– E será a tua perdição, ouve o que eu te digo.

Randi sentiu um arrepio de premonição mas não se amedrontou. Apertou os lábios como se quisesse proteger o seu futuro filho. Ninguém nunca saberia quem era o pai do seu bebé. Nem sequer o seu próprio filho.

Capítulo Um

 

 

 

 

 

– Merda! – grunhiu Kurt Striker entredentes.

Não gostava do trabalho que se lhe apresentava pela frente, nem minimamente, mas não podia rejeitá-lo e não era apenas devido à choruda quantia que lhe iriam pagar. O dinheiro era muito tentador. Já estava em cima da mesa um cheque no valor de metade da soma total. Não lhe tinha tocado.

Era por causa do seu segredo.

Estava no salão em frente da lareira, aquecendo as pernas e vendo através das janelas a terra coberta de neve.

– O que me dizes, Striker? – perguntou Thorne McCafferty. O mais velho dos irmãos, homem de negócios por natureza, tratava sempre de tudo. – Estamos de acordo? Encarregaste de proteger a nossa irmã?

O trabalho era complicado. Striker teria que se converter no guarda-costas pessoal da Randi McCafferty, quer ela gostasse, quer não. E era mais provável que ela não gostasse. Kurt iria pôr as mãos no fogo. Passara tempo suficiente com a única filha do defunto John Randall McCafferty para saber que quando ela tomava uma decisão, ninguém a conseguia convencer a mudar de opinião, nem ele, nem os meios-irmãos dela, que de repente pareciam sentir-se responsáveis pela sua irmã.

Aquela mulher era um problema, não havia dúvida disso. O modo como saíra dali umas horas antes dizia-lhe que ela já tomara a sua decisão. Ia voltar para Seattle com o seu filho, para a sua casa, o seu trabalho e a sua antiga vida, sem se importar com as consequências.

Fugira dali, dos seus três autoritários irmãos, e dele.

Striker não gostava nada da situação mas também não conseguia confiar naqueles três homens, ou podia? Olhava para os três mas não examinava com minúcia os seus próprios sentimentos porque não queria admitir que tinha dúvidas sobre aceitar aquele trabalho.

«Demasiado tarde, não achas?»

Randi era uma mulher muito atraente. Apaixonada e temperamental. Uma mulher que lutava na vida para fazer aquilo que queria, tal como todos os filhos de John Randall McCafferty. Não iria gostar que ele se intrometesse na sua vida, mesmo que fosse para a proteger. Aliás, o mais provável seria que se sentisse ofendida. Especialmente num momento destes.

– A Randi não vai gostar – disse Slade, o irmão mais novo, dando voz aos pensamentos de Striker, mas sem saber metade do assunto.

– Claro que não vai gostar. Quem gostaria? – interveio Matt, o irmão do meio, que estava sentado no cadeirão de couro e com os pés apoiados na mesa. – Eu ficaria muitíssimo aborrecido.

– Ela não tem opção – disse Thorne. Como presidente da sua própria empresa, estava habituado a dar ordens e que o obedecessem. Tinha acabado de se mudar de Denver para Grand Hope, no Montana, mas continuava a ocupar-se de tudo. – Já tínhamos decidido isto, não se lembram? Ela precisa de um guarda-costas para a protecção de si própria e do seu filho.

– Sim, já tínhamos decidido – concordou Matt. – Mas isso não quer dizer que a Randi aceite. Mesmo tendo a Kelly a interceder.

Kelly era a mulher de Matt, uma ex-polícia que se tornara em detective privada. Tinha aceitado trabalhar com Striker neste caso por se tratar da sua cunhada. Com uns cabelos ruivos e uma mente ágil, Kelly seria uma grande ajuda, mas Striker não acreditava que fosse suficiente para convencer a Randi. Não, pressionar um membro da família McCafferty tornaria as coisas ainda piores.

Olhou na direcção da janela onde estava o irmão mais novo, o amigo que o metera nesta confusão.

– Vamos ver, temos trabalho para fazer e não temos tempo a perder. Alguém está a tentar assassiná-la – disse Thorne.

Striker ficou tenso. Aquilo não era uma brincadeira e, no fundo, ele sabia que aceitaria o trabalho; não podia confiar em mais ninguém para o fazer. E, por muito teimosa que fosse a Randi McCafferty, havia um brilho nos seus olhos castanhos que lhe atravessava a pele até ao coração.

A noite anterior tinha-lhe dado a prova de que precisava.

Thorne estava agitado, a preocupação estava espelhada no rosto. Olhou de repente para Striker.

– Aceitas o trabalho ou temos que ir à procura de outra pessoa?

A ideia de que outro homem poderia estar tão perto de Randi provocou-lhe acidez no estômago, mas antes que ele dissesse algo, Slade tomou a palavra.

– Não podemos confiar em mais ninguém.

– Amem – retorquiu Matt, mesmo antes do seu irmão olhar pela janela e ver um jipe a aproximar-se.

– Parece que a Nicole está a chegar.

A tensão nos olhos de Thorne suavizou-se. Passados poucos minutos, a porta principal abriu-se e o ar frio do Montana colou-se à sala. A doutora Nicole McCafferty atravessou a habitação, ainda a sacudir a neve do casaco. Ouviram-se pequenos passos no andar de cima: as duas filhas do anterior casamento de Nicole, duas gémeas de quatro anos, desceram as escadas e invadiram a habitação com risos e gritos.

– Mãe, mãe – gritou Molly enquanto a sua irmã Mindy, muito mais tímida, olhava para ela com o rosto iluminado, e atiraram-se para os braços de Nicole.

– Como estão as minhas meninas? – perguntou Nicole, abraçando as duas pequenas e beijando-lhes as faces.

– Estás fria! – disse Molly.

– Como um gelado – disse Nicole, rindo.

Thorne, que coxeava ligeiramente devido a um pequeno acidente, abriu passo até à entrada da casa e beijou a mulher enquanto as crianças cirandavam à sua roda.

Striker deu meia volta. Sentia que se estava a intrometer numa cena privada. Era a mesma sensação incómoda que o invadira quando Slade o contactara para lhe pedir para os ajudar e também quando fora à quinta pela primeira vez. Fora em Outubro, quando o carro de Randi saíra da estrada em Glacier Park. O parto adiantou-se e, tanto ela como o seu bebé, estiveram a ponto de morrer. Estivera em coma durante algum tempo e quando, por fim, acordou, sofria de amnésia.

Dizia ela.

Striker achava que a perda de memória era muito conveniente para Randi, apesar do médico afirmar que se tratava de amnésia. Striker encontrou provas que outro veículo perseguira o jipe de Randi por uma íngreme colina até ela ter batido contra uma árvore. Sobrevivera e, apesar de ter recuperado fisicamente e a memória, não falava sobre o acidente nem se suspeitava que alguém a quisesse matar. Não incriminava ninguém, ou por realmente não saber ou por não querer delatar ninguém. A mesma coisa que com o pai do seu filho, Joshua. Kurt franziu a testa. Não queria imaginar Randi na intimidade com nenhum outro homem, apesar de ser uma estupidez. Ele não tinha nenhum direito sobre ela, nem sequer tinha a certeza se gostava dela.

«Então, devias tê-la deixado ir ontem à noite quando a viste das escadas, com o seu bebé, e esperaste até ela o ter metido na cama…»

Kurt recordou como a vira sentada na banqueta da janela, cantarolando suavemente, vestida apenas com uma camisa de dormir, a amamentar o seu bebé. Observou-a das escadas, vendo como a luz da lua a iluminava. Fora uma imagem espiritual mas muito sensual e ele ficara à espera na penumbra. A sua intenção era descer as escadas sem ser visto, mas nesse momento uma das tábuas do soalho rangeu e Randi alçou o olhar e viu-o apoiado no corrimão.

– Vamos à cozinha ver o que a Juanita nos preparou – dizia Nicole, fazendo com que Kurt voltasse ao presente. – Cheira muito bem.

– Então, Striker, o que dizes? Aceitas, ou não? – disse Thorne, já de volta à sala. O sorriso que dirigira à mulher e às filhas tinha-se desvanecido. Voltava a ser o homem de negócios.

– É muito dinheiro – lembrou-lhe Matt.

– Olha, Striker, estou a contar contigo – disse imediatamente Slade, afastando-se da janela e com uma visível preocupação nos olhos. – Alguém quer matar a Randi. Eu disse ao Thorne e ao Matt que se havia alguém capaz de descobrir quem o estaria a tentar fazer, serias tu. Vais demonstra-lhes que eu tinha razão?

Com um sentimento de culpa, Kurt meteu o cheque na sua gasta carteira de couro. Não fazia sentido discutir. Não podia deixar que Randi enfrentasse sozinha, com o seu filho, a pessoa que queria acabar com a sua vida.

 

 

– Estupendo! – Randi ainda não tinha percorrido sessenta e cinco quilómetros quando o seu jipe começou a fazer barulhos estranhos. Desceu do carro e verificou que tinha o pneu em baixo. Tinha passado uma bomba de gasolina um quilómetro antes e decidiu voltar para trás mas descobriu que estava fechada.

Até ao momento, a sua viagem de volta à civilização não estava correr como ela planeara, mas também não se podia dizer que ela tinha um plano. Era precisamente esse o problema. Decidira desde o primeiro momento que queria voltar para Seattle o quanto antes, mas ontem à noite com Kurt… Na manhã seguinte, ao acordar, decidira que não podia esperar nem mais um minuto.

Os seus irmãos estavam todos casados e ela voltava a ser, novamente, a que não tinha alguém. Além do mais, ela era a razão pela qual todos corriam perigo. Tinha que fazer qualquer coisa.

«Mas estás a enganar-te a ti própria. A verdadeira razão pela qual te foste embora tão depressa não tem nada a ver com os teus irmãos nem com o perigo que correm, mas sim com o Kurt Striker.»

Olhou pelo retrovisor e viu a dor que os seus olhos reflectiam. Não gostava de fazer de mártir. Nunca gostara.

Teria que ser ela mesma a mudar o pneu mas isso não seria um problema. Aprendera mecânica quando vivera na quinta. Felizmente estava fora da estrada e relativamente protegida do vento.

Rapidamente encontrou a razão do furo. Aparentemente, tinha sido um prego que fizera com que o pneu fosse perdendo o ar aos poucos. Por momentos pensou que não tinha sido um acidente, mas sim que a mesma pessoa que fez com que saísse da estrada em Glacier Park, que tentou novamente matá-la no hospital e que, mais tarde, incendiou o estábulo, também fosse o culpado pelo furo.

O vento gelado que soprava fazia com que a neve lhe batesse na cara. De repente, um arrepio de medo percorreu-lhe a espinha e levantou a vista para a paisagem inóspita.

Mas não viu ninguém, nem ouviu nada. Achou que estava a ficar paranóica e isso não era bom.

 

 

Encurvado, sob a chuva, o intruso meteu a chave na fechadura com uma surpreendente facilidade e entrou no apartamento que Randi McCafferty tinha junto ao lago Washington.

Era uma zona cara de casas unifamiliares. Não podia ser menos do que isso para a princesa. No interior, a casa parecia desarrumada e suja.

Há muito tempo que Randi McCafferty não vivia naquela casa.

Sem fazer barulho, o intruso percorreu as habitações às escuras que se alinhavam ao longo do corredor até chegar ao quarto principal com uma casa de banho. Havia uma segunda casa de banho e um quarto para um bebé, não muito decorado, mas o suficiente para o pequeno McCafferty. O bastardo.

De volta à sala, aproximou-se da secretária onde estava pousada uma fotografia tirada anos antes: os três irmãos McCafferty, altos, robustos e donos de um sorriso irresistível para as mulheres e com um temperamento que os levara a várias lutas, montados a cavalo; diante dos três, de calções, uma camisa sem mangas e o cabelo penteado em duas tranças, estava Randi. Segurava as rédeas dos três cavalos, como se já então soubesse que seria ela a conduzir a vida dos seus três irmãos.

Incomodado, o intruso afastou o olhar da fotografia e accionou o atendedor de chamadas, sentindo uma ligeira satisfação em tocar numa coisa da princesa. Mas foi um sentimento fugaz.

Enquanto ouvia a única mensagem, deu-se conta de que só se podia fazer uma coisa para compor as coisas: Randi McCafferty tinha que pagar, e fá-lo-ia com a vida.